segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Vermelho

Trêmulas, fadigadas e com pouca energia, aquelas pálpebras incapazes de esquecer a noite passada foram se abrindo. Lentamente, como uma sinfonia de poucas notas, preguiçosa e suave. 

O escuro do quarto parecia ter cor. Vermelho, laranja, ferrugem. Como aqueles aveludados e curtos fios de cabelo que reluziam um brilho mágico. A única coisa que eles viam era a insistente imagem de uma mulher incansavelmente encantadora, radiante e estupidamente quente. De sorriso aquecido, de corpo fogaréu. De olhos em brasa. 

E logo foi esquentando. Esquentando a alma, o acordar de um lindo sonho, o despertar de uma esperançosa manhã. Até o sol de amarelo passou a ser daquela cor indefinida como a daqueles cabelos. Até as pessoas passaram a parecer um tanto com aquela mulher. No jeito, no olhar, no cheiro doce.  Logo tudo foi clareando ao escurecer. 

Ao aparecer da lua cheia com traços daquele rosto angelical de quem nem sonha saber ter. E vermelha, lá estava ela, nua banhando todos na rua, lua, no céu crua, sem estrelas ou culpa. E lá estava ela, em algum lugar de uma viela, beco, estrada ou favela, soltando a fumaça de seu cigarro. Então as pálpebras foram se fechando, escurecendo ainda com a mágica daquela cor viciante, relutante em não sonhar mais uma vez com aquela áurea misteriosa. E esse movimento se repetiu por dias e dias a fio...