terça-feira, 23 de outubro de 2012

Tormento

Eu não sei como eu cheguei até aqui. Não sei como adormeci. Mas ao abrir os olhos a única coisa que enxerguei foi o preto, o vácuo, o escuro.
Eu não encontro um feixe de luz qualquer que me oriente. 
Entre o meu desespero e o vazio, me concentro em apalpar o que me cerca a fim de reconhecer uma saída. Tentativas inúteis. 
Deslizo minhas costas na parede até sentar no chão com as pernas dobradas. As envolvo em meus braços e num ato medroso, abaixo minha cabeça até que minha testa encoste em meus braços. 
É assim que vou ficar, por não sei quanto tempo, até que eu possa novamente ver a luz.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Coração puro


- Pai, pai!
- Oi, filho.
- De onde surgiu o amor?
- João, o pai tá lendo jornal agora, conversamos depois.
- Não, pai... só me responde a pergunta.
- Depois, João.
- É rapidinho, vai. Você me responde e eu vou pro meu quarto brincar.
- Tá bom. Fala aí, cara, qual é a pergunta?
- Eu acabei de fazer...
- Faça de novo, estava lendo.
- Eu quero saber de onde veio o amor.
- João, de onde você tirou isso?
- Não sei, pai. Só quero saber de onde ele veio.
- Ah, filho, o amor... o amor...
- Você não sabe, né pai?
- Você me pegou desprevenido. Na verdade eu nunca pensei nisso.
- Então pensa agora e me responde!
- O amor vem do ser humano, da natureza, vem do mundo, do homem.
- E da mulher não?
- Filho, você está apaixonado?
- Não sei, pai. Na verdade eu estou sentindo umas coisas estranhas.
- Que coisas?
- Como se tivessem borboletas batendo as asas aqui na minha barriga.
- E quando isso acontece, filho?
- Quando a Yasmin chega no colégio, ela sempre vem e me dar um beijo na bochecha. Minhas mãos ficam suadas, eu fico nervoso.
- Fica nervoso por que gosta ou por que não gosta do carinho dela?
- Não sei, pai. Ela me deixa nervoso... quando ela fica perto, me olhando muito. Dá esse negócio na minha barriga. Será que dá nela também?
- Não sei... por que não experimenta perguntar pra ela?
- Não consigo, parece que não sei mais falar quando ela fica do meu lado.
- Respira com calma e conversa com ela.
- E se eu não conseguir?
- Vai conseguir! Ela é bonita?
- Ela tem olhos cor de mel.
- Já vi que gostou dos olhos dela.
- É que os olhos dela estão sempre olhando os meus. Não entendo isso, pai.
- Um dia você vai entender...
- Brigado, pai. Vou brincar com meus carrinhos
- Espera aí, rapaz. Por que me perguntou de onde veio o amor?
- Por que hoje ela disse pra mim “eu te amo”...  Acho que o amor surgiu dela, pai.

sábado, 6 de outubro de 2012

O Diário de Helena - Parte III


“Helena Maia Vanilha, aceita Rodrigo Dualibe Castro como seu legítimo esposo?”
Ah, padre, por favor, no próximo sonho comece logo da parte do “pode beijar a noiva”... Esse cirurgião ainda vai casar comigo!

O papo com a minha mãe ontem no telefone só podia dar nisso. Ela ligou pra minha casa perguntando onde eu estava. Acho que a maluquice é uma coisa de genética. Logo perguntei “ué, você ligou pro meu celular ou pra minha casa?”, e ela, mais rebelde que um adolescente na pior fase da rebeldia responde “eu é que vou saber pra qual número eu liguei, não me faça perguntas difíceis!”. Então eu respondi que estava em casa. Acho que foi a pior coisa que eu podia ter dito, tive que escutar uma ladainha altamente chata: “Helena, mas o que é que está havendo com você, minha filha? E os boys?”, para, para tudo!

A minha mãe me perguntou sobre os “boys”, como assim?

“Boys, mãe? Que boys?”, eu ainda não acreditava no que ela estava me dizendo.
“É, Helena, os boys, os bofes, os carinhas lindos, cheirosos e poderosos... vai me dizer que não está saindo com ninguém?”

Era demais ouvir minha mãe falando daquele jeito, mas tudo bem, eu ia descobrir o motivo.

“Não estou saindo com ninguém não...”

Ela suspirou ao telefone e eu pressenti que lá vinha um testamento pronto.

“Helena, você já tem 34 anos, meu bem. Vai ficar encalhada a vida inteira? Coloca uma roupa que valorize essa sua bunda maravilhosa que herdou de mim e esses peitões lindos que tem agora e vai à luta! Não é possível... você engordou, é isso? Porque olha, mesmo se for isso, não tem problema, a mamãe tá acima do peso, mas eu arrumei um boy tão lindo, jovem, descolado, um amor, estou pensando até em morar junto com ele!”

N-Ã-O   É   P-O-S-S-Í-V-E-L!

Eu parei, respirei, reproduzi tudo que ela tinha dito na minha cabeça de novo e lá fui eu tentar entender e ver se eu não tinha viajado: “Como é que é, mãe?”

“É Helena, você tá devagar, hein? Mamãe tá namorando, ele é um garotão, meu amor, 31 aninhos, surfa, malha, é empresário, arrumei um príncipe.”

PUTA QUE PARIL!

“31 anos??????????? Você pirou, mãe?”

“Não, meu amorzinho, eu só estou fazendo o que você não anda fazendo, pelo visto, né? Me divertindo, beijando na boca e claro, fazendo muito...” Lógico e óbvio que eu não queria escutar o resto e a interrompi.

“Tá bom, tá bom, já entendi, não precisa continuar. Você me ligou pra me contar que está namorando com um cara 30 anos mais novo e jogar na minha cara que eu estou encalhada, é isso?”

“É, filhota... precisa arrumar um boy pra sairmos juntos!”

“Sairmos juntos?”

“Ainda não te contei, mas eu vou com o Ricardinho aí te visitar! Mamãe chega em breve filhota, arruma a casa!”

Ricardinho? Me visitar? Namorando? É, deve ser o fim dos tempos pra mim!
...

Foi com essa linda novidade e com esse pensamento que fui dormir. E hoje acordei desse lindo sonho. Eu nunca te desejei tanto na vida, Dr. Rodrigo Dualibe Castro!
Agora vou afogar minhas tristezas num bolo de chocolate com um cappuccino, porque definitivamente é o que me resta.

Um beijo depressivo.

> Conheça o blog real da Helena: http://odiariodehelena.blogspot.com.br/